quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Escritos de São João da Cruz - "Êxtase de alta contemplação".

Entrei aonde não soube
e quedei-me não sabendo
toda a ciência transcendendo.

Eu não soube aonde entrava,
porém, quando me vi,
sem saber onde estava,
grandes coisas entendi;
não direi o que senti,
que me quedei não sabendo,
toda a ciência transcendendo.

De paz e de piedade
era a ciência perfeita,
em profunda soledade
entendida (via recta);
era coisa tão secreta,
que fiquei como gemendo,
toda a ciência transcendendo.

Estava tão embevecido,
tão absorto e alheado,
que se quedou meu sentido
de todo o sentir privado,
e o e´spírito dotado
de um entender não entendendo,
toda a ciência transcendendo.

O que ali chega deveras
de si mesmo desfalece;
quanto mais sabia primeiro
muito baixo lhe parece,
e seu saber tanto cresce,
que se queda não sabendo,
toda a ciência transcendendo.

Quanto mais alto se sobe,
tanto menos se entendia,
como a nuvem tenebrosa
que na noite esclarecia;
por isso quem a sabia
fica sempre não sabendo,
toda a ciência transcendendo.

Este saber não sabendo
é de tão alto poder,
que os sábios discorrendo
jamais o podem vencer,
que não chega o seu saber
a não entender entendendo,
toda a ciência transcendendo.

E é de tão alta excelência
aquele sumo saber,
que não há arte ou ciência
que o possam apreender;
quem se soubera vencer
com um não saber sabendo,
irá sempre transcendendo.

E se o quiserdes ouvir,
consiste esta suma ciência
em um subido sentir
da divinal Essência;
é obra da sua clemência
fazer quedar não entendendo,
toda a ciência transcendendo.
São João da Cruz.

Fonte: Obras Completas do Doutor Místico São João da Cruz. Coimbra, 1977.

Um comentário:

Anônimo disse...

Vc poderia colocar a parte das explicaçõs do poema, por favor?
(São João da Cruz também escreveu as explicações dos seus poemas).
Deus abençoe :)